É esta estranha e súbita melancolia que me assalta no berço da noite. Esta languidez que arrasta e corrói quando a energia das convicções se esbateu na inércia de um subterfúgio desfeito. É o sentir que se perdeu algo na unicidade de um corpo que jamais foi completo e, no entanto, a consciência trágica de que a peça largada na incerteza dos sentimentos não era, no derradeiro final, a que iria completar esta existência. É o bailar das palavras que tentam expressar o desfalecer de uma esperança que caminhava com muletas e agora anda de cadeira de rodas, não obstante algo cá no fundo que diz que ela já foi morta e se aproxima o enterro. Ah, mas é o persistir de algo mais, a certeza que arranha a alma de que seremos menos, mas ainda seremos, e neste pequeno ser talvez esteja a grandiosidade do nosso futuro. Ah, é esse saber que dói, porque neste momento estar bem é cair na moleza do afirmar que não fez diferença, quando faz toda a diferença sabê-lo e ouvi-lo dizer. Mas a vida segue a mesma amanhã, não obstante as palavras atiradas sem respeito para metáforas que surgiram de repente de uma hipérbole emocional, sem que jamais fizessem sentido sequer para quem as escreveu. E quem hoje as escreve, no berço da noite, recusa os lençóis vazios e o prazer incauto de se dar a si próprio, porque não há mais paixão sequer que dê asas ao sonho de que em breve alguém o fará. Este roubo, esta usurpação de um caminho iluminado por lâmpadas que se vieram a descobrir fundidas, não é roubo mas restituição, porque o que não nos pertence acaba sempre por ser devolvido às teias do mundo, para de novo ser entregue à pessoa errada, até que um dia, esperemos, rezemos, alcance as mãos certas. Ah, doce ilusão de ser a metade cheia do copo.
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