sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Era uma vez, outra vez

Aqui estou eu – novamente – decidida a escrever – novamente – algo, não sabia o quê, até me ter deparado com um invulgar pedido.

Não parecia fazer muito sentido, mas então comecei a pensar.

A lembrar...

Sim, nostalgia. E eu nem gostava muito da terrinha. São Salvador. Mas lá que era inspiradora, era. O grande problema sempre foi a falta de um computador, que quebrasse a solidão dos montes verdes e caminhos de terra abandonados. E, não obstante, era eu criança e ingénua, aspirei à grande loucura de começar a escrever à mão, num caderninho de capa preta que usara para a escola mas que só gastara as primeiras páginas, e no qual colara a imagem de uma fada, a qual, recordo, tentei, heróica e falhadamente, pintar num quadro para Educação Visual no ano lectivo seguinte. Assim, aquela terra virou um marco importante.

No Verão que passou devia ter pegado numa máquina fotográfica a sério e ido passear pelos carreiros de ovelhas. Nunca por lá andei. É pena que só me tenha lembrado disto agora. Eu digo e repito que não gosto daquilo, mas quando tiver um cansativo trabalhado e uma vida movimentada na cidade, eu vou passar férias a um sítio como aquele. Longe da civilização. Perto da natureza. No interior de Portugal. Únicos requisitos: computador – muito, muitíssimo importante, não fosse eu uma aspirante a escritora –, iPod – o silêncio, a paz do campo são muito agradáveis, mas a música é a minha alma – e, por certo, a maquina fotográfica.

Ia ser uma pessoa muito feliz assim.

Então, pergunto, porque é que detestava – e suponho que detesto, embora não haja mais férias de Verão em S. Salvador (logo agora que já podia levar um portátil! A vida é injusta) – lá ir? É uma muito boa pergunta. Talvez vá ser ingrata e dizer que era tanto melhor quanto mais sozinha, e o que lá não falta são pessoas conhecidas (e vem dar um beijo à tia, e cumprimenta o tio, e lembras-te da prima? Hã, pois, não, nada mesmo...) A minha mãe diz que sou um bicho do mato, talvez tenha razão. Mas eu quero aquele lugar para escrever, para pensar, para apreciar, e isso faz-me extraordinariamente melhor sozinha. Quando e como quiser. (Eu sou um pouco anti-regras, é verdade, e anti-horários já agora.) Por isso este último ano – privilégios da idade – soube extraordinariamente bem poder ir para onde quisesse. Não que houvesse algum perigo de uma criança andar por aquela aldeia sozinha, mas mães são mães.

Bem, isto está a soar como se fosse maravilhoso, mas leiam o que eu escrevi a princípios de Setembro e verão como não estava nada agradada por lá ir. Não creio que estou a suavizar, realmente parece mais tentador agora. Suponho que seja por estar cansada da rotina, autocarros, escola, trabalhos (sim, vida atarefada). Lá tudo era calmo e sem pressas. Podia lá ir de bom grado uma semana (mas jamais sem o primeiro dos requisitos, porque aquilo ao fim de um dia torna-se um aborrecimento do pior; os livros são – e foram sempre – uma excelente salvação, mas no topo está mesmo a escrita.)

Enfim, da boca para fora eu disse muito mal daquele lugar, mas, dos poucos Verões em que lá fui (felizmente para mim, a minha prima é que vai lá sempre e adora aquilo, eu cá continuo a passar; antes a minha casa e o meu Algarve – e a minha mãe concorda inteiramente comigo, não fosse a avó do norte a paterna) coleccionei um bonito álbum de memórias. Curtas e fotográficas, fazem-me sorrir.

É a minha irmã ainda pequenina a olhar o galinheiro que antes havia em frente da casa, e a pedir para ir ver os burros (algo que pedia todos os anos), e nós a subir e descer as escadinhas de madeira para passar o muro de pedra que conduzia à eira.

E aquele Verão em que fui picada por uma vespa, aquele em que elas se revoltaram contra nós, porque houve mais duas “vítimas” nesse dia. Lembro-me que estávamos a jogas às escondidas...

Houve também uma tarde de temporal, chovia muito e estávamos na cozinha da avó a descascar feijões. A trovoada sobressaltou-nos. Não sei se ainda tinha medo nessa altura. A minha prima sim, muito. Acho que a minha irmã estava em casa a dormir, teria sido na primeira vez que lá foi.

Uma vez também caí da bicicleta que uma rapariga me empresou. Não me lembro dela, mas se tivesse de apostar num nome diria Rita, mas não tenho bem a certeza (se estiver errado aposto que a minha prima fará questão de vir dizer-me). Acho que não a voltei a ver. Mas esse Verão teve bons momentos em boa companhia. O alpendre já estava construído e depois do almoço juntávamo-nos, uns cinco, seis, sete pessoas (eu nunca ia poucas vezes à aldeia, mas a minha prima conhece bem a malta) a jogar Uno. Fazíamos um pouco de batota; somávamos os ‘+2’ aos ‘+4’ e atingíamos valores de vinte e tal cartas para o coitado que tinha de as ir buscar ao baralho.

O meu pai andava sempre com um mata-moscas, porque é a diversão número um para quem não tem nada que fazer, e acreditem que alvos não faltam. Havia uma corda pendurada no alpendre e ele punha-se a contar as moscas que lá pousavam ao mesmo tempo. Chegavam a ser mais de dez. Também me lembro de que o Romão, o cão da minha tia, um dia soltou-se e matou uma galinha de um vizinho. Ele tinha uma ‘namorada’ da mesma raça, com um olho de cada cor, que aparecera lá não ser bem como. Chamava-se Andorinha. Eu fiquei muito revoltada quando mais tarde soube que a minha avó tinha morto os filhotes que ela havia parido.

Este Verão a minha tia, à qual fui ao casamento, já tinha mais outro cão. Não me lembro do nome. Mas também era grande e a minha irmã adorava-o. Acho que tenho uma fotografia dele no telemóvel. E acho que o nome começa por G.

Mas as melhores memórias são as do parque da escola primária, precisamente onde me refugiei, certo final de tarde, para escrever. Já deixei aqui as fotos em Setembro. Mas aquele parque foi mais do que o palco do princípio. Era para lá que ia sempre, com a minha irmã, com a minha prima, com as duas, quando queríamos dar uma volta, brincar um pouco. Somadas, devo ter passado umas belas horas naqueles baloiços, e poucas sentada na posição correcta. Somente que eram mais confortáveis quando virados ao contrário, e eu sei do que falo, porque testamos todas as opções possíveis, até de cabeça para baixo. Quando éramos mais novas, lembro-me da minha prima balouçando muito e depois atirando o chinelo. Acho que tentávamos ver qual de nós atirava mais longe. A minha irmã ia buscar, ou então ela, que não tinha problemas em andar descalça. Uma vez o dela ficou preso na árvore. De alguma forma, conseguimos tirá-lo. Apenas no ano passado entrei pela primeira vez dentro da escola.

E por hoje é isto. Não pretendia alongar-me tanto, não pensara sequer que iria escrever sobre isto, mas soube estranhamente bem. Assim, acabo agradecendo a sugestão. Às vezes faz bem simplesmente parar e lembrar.

Deixamos tanta coisa para trás.

1 comentário:

Rafaela Neves disse...

memorias tao boas! dias tao bons aqueles que la foram passados por nos as trez! a mimi anda sempre conosco e no dia que fomos andar de bicicleta ate estranhamos a ausencia dela mas em fim a minha tia e k manda. e nao acredito que ainda te lembras de tanta coisa! pensava que ja te tinhas eskecido do jogo do chinelo! foram veroes fantasticos. e espero sinceramente que um dia mais tarde possamos voltar la as tres para reviver todas estas memorias