quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Epifania

Quando os medos que se alojam no teu coração gritam mais alto que o teu desejo mudo de os silenciar, a tua alma adoeceu.

Pisamos estradas de calçada irregular, lama suja, pedras afiadas e alcatrão ardente de pés descalços. As feridas são o passar dos anos gravados na pele, as cicatrizes memórias da vida. A dor é um dos mil possíveis resultados da experiência, que é tão somente fruto da coragem. O medo é reservado para os que não vivem, ou para os que não têm coragem de viver.
Todas as histórias são escritas com sangue, lágrimas e suor. A tinta é o sangue negro de uma alma morta que se recusou cruzar as portas da segurança e a provar o mundo, que sabe que por vezes ele é amargo, intragável quase, mas que desconhece que outras vezes pode igualmente ser muito doce.
O espaço reservado para o amor depende inteiramente das fronteiras do ódio. E se amar é fácil, odiar é mais fácil ainda. Porque amar magoa e
odiar não, é preciso coragem para o fazer. E não é maior a loucura dos loucos do que a loucura dos que se deixam
assombrar pelo medo ou arrebatar-se por uma paixão cega. Porque mais loucos ainda, são os que
pensam que podem amar alguém sem antes se amarem a si próprios.
Olhamos para os outros da forma que nos olhamos ao espelho.

Se não puderes sorrir perante o teu reflexo, a tua alma adoeceu.


segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Veio e foi. Natal.

Nestes dias de barretes vermelhos e árvores decoradas, desejos de presentes e jantares com muita gente, penso o que sempre pensei. A Consoada não pareceu como uma Consoada.
Recordo uma vez que era pequena e passei a véspera de Natal em casa do meu avô paterno com os meus tios. Nunca gostei daquela casa. Nunca gostei das prendas que ele escolhia, isto quando ele ainda se lembrava de oferecer alguma coisa. Agora, já é bom que telefone. Mas, por alguma razão, essa noite assentava melhor no ideal de uma Consoada. A família reunida, confusão, a mãe stressada, a prima chateada, enfim.
O geral é nunca ter nada disso. À mesa somos poucos e tendeu a diminuir. Não são os lugares à mesa que contam, sei, mas parece, cada vez mais, que há muito pouco de natalício neste Natal. Talvez porque é habitual sermos nós cinco à mesa. Bem, quando eu estou em casa. Antes era diferente. Antes descia à casa da avó no rés-do-chão para o almoço de Natal. Antes éramos seis à mesa e a Raquel está a ficar comovida. A questão é: antes costumávamos ser só quatro no dia-a-dia, e sempre havia que somar mais dois no Natal para fazer a diferença. Mesmo que fosse igual a todos os almoços de domingo, aqueles que nunca mais tivemos, na casa dos avós. Geralmente, nós descíamos. Eles dois só subiam em ocasiões importantes.
Então, se não fossem as travessas exageradas de doces, os bolos, as tartes, não teria havido grande diferença entre a Consoada e qualquer outra noite.
Dia 25 foi algo diferente, mais natalício, se não lhe tivesse perdido o espírito. Mais família, tios, primas. Talvez tenha posto as coisas de forma errada. Mais família não é igual a mais Natal. Faltou-me o calor, faltou-me a magia.
Faltou ser criança.
Tenho saudades dos tempos em que havia pelo menos um presente cujo conteúdo eu não sabia qual era. Tenho saudades da curiosidade, quando a minha mãe não embrulhava os presentes no próprio dia e fazíamos uma pilha com eles a um canto. Não são saudades do tempo em que podia fazer uma pilha com eles, mas sim daquele momento em que olhávamos para as etiquetas e dizíamos "este é para ti".
Tenho que comprar uma prenda para a minha mãe. Lamento não ter tido oportunidade antes.
No fundo, o Natal realmente é das crianças e, mais não seja, tenho saudades de quando a minha irmã ainda era realmente criança, e pedia brinquedos de crianças, e eu gostava quase mais de a ver abrir as prendas dela do que as minhas.
Afinal de contas, não é só um dia em família. Porque todos os dias devem ser dias em família. Natal é mais que isso. Foram sonhos, esperanças, coisas de criança que se perdem quando temos idade para pintar o mundo com as suas verdadeiras cores. O espírito de Natal mede-se pela intensidade com que fazemos a contagem decrescente e, este ano, senti-me como se tivesse tropeçado na data, olhado para o calendário e perguntado "já é Natal?".
Era. Veio e foi. Deixou gravada uma marcada entretanto, chamada nostalgia.

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Home Sweet Home

Sofá, lareira, voltar a escrever.

Só e apenas. Hoje chega-me.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Tempo para reviver

Preciso de dar uma volta ao uso que faço de cada hora destes dias. A contagem decrescente começou desde que regressei, e se é muito o tempo, também são muitas as coisas que tenciono fazer.
O calendário vai enchendo com compromissos. Iludo-me com o depois da passagem de ano, quando só eu estiver de férias. Não será bem assim. O tempo tem a sua própria táctica para desaparecer. E eu preciso...
. de estar com as pessoas.
. de voltar a escrever. Sobretudo de voltar a escrever.
Tenho de abrandar o meu ritmo de vida. É estranho como o que antes era familiar se torna diferente, raro.
Talvez devesse começar a usar bem o tempo agora. Mas é tarde e ando com horas de sono para cobrar...

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

RED

Encontras o caminho e paras.
Olhas para os dois lados. Atravessas.
A história escreve-se do outro lado.
O sinal estava vermelho.

"Só sei que nada sei". Apetece-me viver.
Ponto final.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

(des)consolo

Desconsola-me. Há palavras que leio que não fazem sentido, desviam-se do significado que não quero que tenham, encostam-se a uma esperança mais cálida, pintada com cores mais acolhedoras.
Há meias verdades cuja meia mentira é frequentemente ignorada. E depois dói. Arde lá no fundo, desconfortável, como uma comichão da pele. Incomoda muita gente que não consegue dormir, que não consegue escrever, que não consegue fechar a porta ao problema.
Os códigos que regem este nosso mundo são uma coisa demasiado complexa para nós que os inventámos percebermos. Como um poeta que não entende o sentido dos seus versos. Infantil, criar sonhos grandes demais para uma vida tão pequena.
E tudo o que eu queria era ver. Ver por dentro. Nas entranhas do teu coração, ver se bate depressa ou devagar, quando pára, quando se encolhe, quando sangra. Pintá-lo em cada momento, para guardá-lo para a posterioridade, para um dia em que ele não reaja, não me veja. Se não for hoje esse o dia.
Amar é uma oportunidade. Como tudo na vida, tem um prazo de validade. Só que não vem explicitamente expresso.
Há quem se esqueça que os sentimentos mudam. Há quem não perceba que as pessoas crescem. O tempo não é um desfile de dias e meses. É real, físico, concreto. E sente-se da pele aos ossos.
Demasiado tarde, compreendemos que podia ter sido de outra forma.
Demasiado tarde, percebemos que podíamos ter dito outra coisa, feito outra coisa.
Mas se a esperança é verdade, não nos cai ao pés, arrastada pelo vento, lavada pela chuva, seca pelo sol. Há que dar-lhe vida, tomar nas mãos o seu corpo inerte, soprar-lhe nos lábios, inchar-lhe o peito de ar, até bater o seu coração.
É preciso agir. Ser pró-activo.
É preciso querer.
Desconsola-me. Quando não fazemos o que é preciso para merecer essa oportunidade.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

And that's it. 18

Preciso de reflectir. Calma, lenta e profundamente.
O velocímetro da minha vida tem disparados todos os radares. Cabeça, corpo e mente, num rodopio de luzes e cores, vozes e sensações. Soterrada. Encantada. Cansada. Entusiasmada. Tudo, Tudo.
Preciso de um tempo em frente à lareira, enrolada nas mantas, em minha casa, com a televisão ligada e a família ao redor. Preciso deste Natal por aquilo que ele significa realmente; não são as prendas, não é a árvore, não é a comida. É a família. Preciso de parar e voltar a casa, voltar à família. Parar, assentar, olhar em redor e perceber: algo mudou. O tempo passou, num calendário diferente com o mesmo número de dias. E é tão diferente que parece mentira. Como fazer anos e não estar em casa, não ser acordada pela mãe pela manhã, não ter um embrulho à esperar, beijos para dar... E estas lágrimas são de saudade. Esperaram muito por cair. 18... o que é isso? Foi uma noite espectacular, foi receber mais mensagens (90% via FB) de parabéns do que alguma vez antes, foi rir, foi recordar como é patinar no gelo, foi acabar na noite seguinte a ver Chocolat e no mesmíssimo dia a prof. de Inglês passar o filme na aula. Foi bom, em todos os sentidos. Mas foi também diferente. Como se passasse a nevar no verão.
E ainda não acabou. Amanhã vou para o Algarve. Eu amo estas pessoas, mas também preciso de comemorar esta dita importante data com as pessoas que há tantos anos estão presentes neste dia. Preciso de um forte abraço vosso, hoje, amanhã, depois.
Preciso de parar de chorar. Está quase... Falta um dia, falta uma semana. Férias... Depois de três meses, mais de três dias em casa vai ser tão estranho como óptimo. E então, a vida dá mais uma volta, ano novo, vida nova; ela já é nova desde Setembro, mas o novo estará lá, no fim do primeiro semestre, exames, mudar de casa em Março; sim, vou, e quero tanto!
Depois de um mês a lareira, voltarei a disparar os radares. Agora, só quero dar um beijo a todas as pessoas especiais que estão no Algarve. Se pudesse, não voltava para a última semana, mas a agenda está preenchida, como sempre.
E cada dia vale a pena. Até ao fim.

sábado, 4 de dezembro de 2010

Silêncio

O silêncio é um monstro invisível que absorve o espaço, encolhe-se e alarga-se, molda-se ao limite das paredes desta casa, destes quartos. Tão fácil de quebrar, ele intensifica-se e cresce, tão denso como a água, tão transparente quanto ela, ocupando cada vazio, cada ausência.
O silêncio é como o nada, tão banal, tão desprezado, impossível de ter e de querer, mas doce de sentir, rápido de dar.
É a voz desta casa neste fim de semana.

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Todas as horas são certas

Não é tarde nem é cedo, todas as horas são certas. É como chegar a casa e começar a chover; querer entrar e abrirem-nos em porta; oferecerem-nos algo antes de pedirmos.
Com a certeza porém de que são poucos os que dão o que não é pedido, pago ou requerido, podemos sonhar com a generosidade humana, ou, se tanto não basta, com a probabilidade de sermos tocados por uma divina coincidência que de divina geralmente pouco tem.
Insisto em recriminar-me por frases tão longas, mas bem vistas as coisas, não há pontuação que regule o pensamentos. Não há inclusive regras que ponham e disponham das ideias que saltam e ressaltam, que caiem e descaem, que nos conduzem e nos atropelam; enfim, que nos mudam.
O nossa mente é um sítio complexo para se viver. E não importa o que se diga ou desdiga, não se compreende a teoria de uma dor de cabeça, se é física, mas não batemos com ela em lado nenhum, são as ideias a fazer pressão nas veias do cérebro, é a mente convulsionando pelos problemas que lhe arranjamos.
E no final, para retomar o que se perdeu quando as palavras tomam a rédea do discurso e falam por si, todas as horas são boas horas, porque, reclamem os filósofos, protestem os religiosos, batam palmas os ateus, não se pode adiar viver.